Quando Saramandaia foi anunciada, se criaram grandes expectativas por toda a curiosidade em torno desse universo mágico que a trama propunha. Com as chamadas no ar, essas expectativas só fizeram aumentar, inclusive para esses que vos escreve. Porém, quando a novela estreou, tivemos reações diversas: Rodrigo se empolgou e não foi pouco, já Rafael ficou receoso e achou que não embarcaria, como de fato não embarcou. No decorrer dos capítulos, Rodrigo seguiu acreditando e confiando na trama, enquanto Rafael não se envolvia pela história e sentia que faltava algo. Esse nosso “divergenciamento” representada muito bem o que aconteceu com o público, que acabou se dividindo, ou seja, enquanto uns não se empolgavam, outros se divertiam com Saramandaia.
No entanto, com pouco mais de dois meses no ar, acabamos chegando a um acordo: Saramandaia é incontestavelmente uma novela muito especial. Rafael acabou tendo que dar o braço a torcer e passou a ver a trama com outros olhos, enquanto Rodrigo constatou que tem valido muito a pena acompanhar a trama. Mas porque achamos Saramandaia especial? Acreditamos que o que a trama tem de melhor, além das grandes atuações, texto delicioso, direção caprichosa e os seus “absurdos” mostrados com uma riqueza de efeitos especiais, é o uso da metáfora para mostrar um dos graves problemas do Brasil que vem sendo muito discutido ultimamente: A dificuldades da sociedade em aceitar as diferenças, a intolerância, o preconceito e de como isso afeta esses ”diferentes”. A novela faz essa crítica de forma perfeita, brincando com as palavras de forma simpática e com humor, usando e abusando do surrealismo da trama, de simbolismos e do humor.
João Gibão, interpretado por um ótimo Sérgio Guizé, que até então era desconhecido para muitos, mas que é dos melhores atores de sua geração no teatro - E claro, na TV, não fugiu a regra - é um dos personagens pelos quais essa questão que falamos acima, é retratada. Gibão esconde que tem asas desde que nasceu por se sentir esquisito e por medo de não ser aceito na sociedade, e com isso sofre muito. Como todos pensam que ele tem uma corcunda, ainda assim acaba sendo alvo dos comentários maldosos de parte da população de Bole-Bole/Saramandaia, principalmente pela sogra, Maria Aparadeira e Dona Redonda. Sérgio Guizé é uma grande revelação e está muito bem como Gibão, com uma atuação contida como o papel pede, vivendo um “corcovento” inesquecível. As dobradinhas dele com Chandelly Braz que faz uma Marcina bárbara e com Renata Sorrah, que vive sua mãe, Leocádia, são incríveis. A seqüência em que Gibão revela suas asas para Marcina, seguindo-se com a primeira transa dos dois e o vôo de Gibão sobre a cidade, ao som de “Pavão Misterioso”, foi uma coisa linda de se ver, sensível e poética, onde ficou clara a sensação de liberdade de um personagem até então oprimido. Além de Gibão, o preconceito, é retratado ainda através de outros ótimos personagens como: Dona Redonda, a futriqueira e intriguenta obesa da cidade, Aristóbulo o professor verborrágico que uma vez por semana vira lobisomem e sofre de “armarismo” entre outros. Aliás, por sinal, toda a sequencia da aguardada explosão de Redonda foi incrível, ela vai dilatando em todos os órgãos até que explode uma verdadeira bomba atômica colorida, e todos personagens sentem a explosão, uma cena hilária e muito bem feita!
Quando as expectativas correspondem ao que esperávamos é uma delícia, quando ela passa a corresponder também, agora quando no meio de uma trama ela nos surpreende é melhor ainda. Saramandaia é uma novela mágica e poética, que te permite viajar assistindo, que te surpreende e te encanta. E além de tudo, passa uma bela mensagem: a busca pela liberdade e igualdade, e o respeito às diferenças. Não tem como não te cativar, ao menos se você for muito preso ao realismo, caso contrário, é só voar á vontade, porque em Saramandaia tudo pode.
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